8 de agosto de 2010

Faltou-lhe o ar. Era tarde e boca nenhuma quis soprar-lhe um pouco de vida. Apesar da agonia, morria satisfeito em frente ao espelho. Ninguém lhe massageou o peito. As únicas testemunhas de sua morte olhavam tudo com naturalidade. Talvez não o quisessem mais vivo. Talvez estivessem cansadas de mantê-lo, sem razão, ainda nisto que se chama vida. Fez-se o silêncio. Enterraram-no, em espetáculo hipócrita, com honras de Estado. Sua missão fora cumprida no tempo exato de ser. Agora era errar ao inventar memórias. Pensamentos em pratos postos à mesa. Banquete às moscas. Do que era, só um retrato desfocado na parede para invocar o tempo de ter sido. Para os outros, nada, nem dor no peito, nem nó na garganta, nem lágrima, nem a falta absurda que se deveria sentir. Morreu e foi enterrado. E se existe Deus, ele está no inferno.

2 comentários:

Oicreal disse...

Se deus existe é um grande comediante, e a sociedade sua porca plateia.

Márcio Bergamini disse...

Oicreal, leia um texto de 10 de setembro de 2009.